Especialistas estudam os efeitos da fé sobre o cérebro humano

Imagem: Mensagens com Amor
O cérebro humano é um mistério ainda para a ciência. Centenas de pesquisas são realizadas para entender essa máquina. E quais são os efeitos da fé sobre o nosso cérebro? A resposta para essa pergunta também tem sido buscada por cientistas que querem entender a ligação.



Fé e razão por muito tempo se estranharam. Aos poucos, começaram a se conhecer e dessa união surgem respostas que explicam muito sobre a nossa capacidade de acreditar no que para o homem é impossível. Mas este é só o começo de uma conversa que tem muito a revelar.

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De acordo com o neurocirurgião Raul Marino Júnior, um dos mais importantes neurocirurgiões do país, cientistas já responderam muitas perguntas sobre a máquina que nos comanda. Mas algumas áreas ainda estão em constante pesquisa. A ciência descobriu porque andamos, armazenamos informações e até de onde vem algumas doenças, mas sobre a fé, a pergunta que norteiam as pesquisas é se o cérebro seria o responsável pela produção do que acreditamos.

Depois de muita resistência, a ciência aceitou o desafio de estudar a fé e a ligação com o cérebro. Marino realizou pesquisas no Brasil, nos EUA e no Canadá. Em 2007, lançou o livro 'A religião do cérebro : as novas descobertas da neurociência a respeito da fé humana'. Segundo Marino, o cérebro humano tem 100 bilhões de células nervosas conectadas. Como em uma orquestra, cada neurônio trabalha individualmente e de forma harmoniosa. Juntos regem a nossa vida.

“O cérebro armazena e é capaz de gerar funções que podem ser explicadas pela neurologia. Quer dizer, como é que o cérebro funciona para que o indivíduo possa ter sua consciência, possa saber o que é alma, o que é espírito, o que é vontade, o que é fé. Acreditamos que a fé está toda controlada por esta ‘coisa'. Por esta rede de neurônios que são células cerebrais que dão ao homem uma coisa que os animais não têm: a capacidade de pensar abstratamente, criar uma metafísica, criar um sistema filosófico, espiritualizado de religião. Quando o homem começa a se dar conta que ele não é só matéria, que ele deve ter algo por trás, um sopro qualquer que dá a vida pra ele - ele não sabe como surgiu - não adianta você querer explicar as coisas só pela ciência”, diz.

A palavra fé vem do latim fidis, que é fiar-se, ter confiança. E é à fé que a esteticista Cristiane Zaglobinski Santos atribui a cura do filho Rômulo. Há dois anos, quando estava com sete meses de vida, ele foi diagnosticado com pré-leucemia. A mãe conta que ao saber da doença, ficou abalada. "Ele ainda não tinha o câncer, mas teria que fazer o tratamento como se fosse para não entrar na leucemia propriamente dita". O menino foi acompanhado por um médico de Sorocaba (SP) e a mãe foi convidada a participar de um grupo de oração. “A gente fazia as rezas e colocamos o nome dele para ser atendido. Depois de um tempo, quando voltei ao médico e ele abriu os exames, parou e me perguntou o que eu tinha feito. Cheguei a levar um susto achando que tinha feito algo errado e prejudicado a saúde do meu filho. Mas foi ao contrário. O médico me disse: seu filho não tem mais nada”, relembra a mãe.

Para o pai, Marcelo Alves Furian, a cura do filho foi devido à fé. "É a única explicação plausível que encontro", diz.

Nessa busca por explicações sobre os efeitos da fé na vida das pessoas, pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) se reúnem uma vez por semana para discutir a relação entre saúde, espiritualidade e religiosidade. De acordo com o psiquiatra Frederico Camelo Leão, a condição de fragilidade humana em conexão com algo maior - seja esse algo maior, Deus, o universo, todo absoluto - o inserem, fortalecem. “Além de relações de apoio social, um grupo religioso, por exemplo, que comunga da minha fé e que tem uma forma de fortalecimento disso é uma forma positiva de que a fé venha beneficiar o enfrentamento da doença e a saúde”, comenta.

Para a coordenadora do Museu de Anatomia da USP, Maria Inês Nogueira, quando a pessoa acredita em algo, o cérebro reage de outra maneira. “Ele reage produzindo substâncias que ajudam você a caminhar de forma melhor ou identificar aquilo que você acredita que seja mais adequado para realizar o seu objetivo”, diz.

Ondas cerebrais

O pesquisador Marino conheceu e trabalhou com Michael Persinger, um fisiologista e psicólogo canadense, que pesquisou de que maneira o cérebro responde a estímulos eletromagnéticos. As pesquisas foram feitas com voluntários durante preces por meio de equipamentos que detalham o cérebro. Persinger criou uma espécie de capacete, apelidado de ‘capacete divino’.

A equipe médica percebeu que quando entramos em estado de contemplação, algumas áreas do nosso cérebro são ativadas. O lobo pré-frontal, responsável pelo controle das emoções e o lobo frontal aumentam de tamanho. Outra área ativada é o lobo temporal. Segundo Marino, pela estimulação cerebral, com aparelhos especiais, ou também pelo eletroencéfalograma, os especialistas perceberam que existe um quarto estado de consciência, que é o estado de meditação.

O psicobiólogo Marcello Árias, outro especialista nessa linha de pesquisa, explica que quando essas ondas eletromagnéticas atingem o lobo temporal esse indivíduo que está em um quarto escuro, fechado, começam a relatar experiências que podem sim serem místicas.

Marcello Árias estuda a interferência do nosso organismo sobre as funções mentais. Árias já escreveu vários livros sobre o assunto e faz um alerta. “Eu não afirmaria que o homem tem necessidade de religião. Ele tem a necessidade da espiritualidade. A espiritualidade como busca de sentido à vida. As religiões vieram a posteriori. Elas são institucionalização da espiritualidade, porque eu posso muito bem ser uma pessoa espiritualizada e crente sem estar vinculado a nenhuma religião”, comenta.

Ainda segundo Árias, os neurocientistas começaram a identificar algumas pequenas estruturas, alguns pequenos comportamentos neurobiológicos que podem sim nos diferenciar. “Você pode ter nascido com uma maior probabilidade, uma maior tendência de desenvolver circuitos neurais que te capacitam vivenciar uma experiência que pode ser por você definida como uma experiência mística, transcendental. Em contrapartida, você pode ter pessoas que mesmo orando, que mesmo participando de rituais, que mesmo profundamente, não consigam ter estas expansões de consciência, estas experiências ditas místicas, religiosas”, completa.


Pesquisadores americanos chegaram a definir o local exato que nos conecta com o divino. (Foto: Reprodução TV Tem)

Fé e cérebro

Ainda das pesquisas divulgadas temos então como localizar a fé em nosso cérebro? O neurocirurgião Eduardo Carlos da Silva, de São José de Rio Preto (SP), acredita que sim. Segundo ele, pesquisadores americanos chegaram a definir o local exato que nos conecta com o divino. “Uma área que está sendo chamada de 'Ponto de Deus', na região temporal anterior do cérebro. Nessa área há a maior captação de metabólicos. Há um metabolismo evidenciado pela ressonância magnética funcional. Através do eletroencéfalograma, é possível perceber a produção de ondas maiores, gamas, que varia de 38 a 100hertz por segundo. Nessa situação, pode ser realizado o maior incremento - não só de atividade metabólica - mas também de atividade elétrica”, diz.

O neurocirurgião Raul Marino Júnior complementa que existem ondas quando estamos desperto, as ondas rápidas, as ondas quando o indivíduo está em estado de coma, que são ondas muito lendas, e tem as ondas quando você está dormindo, que são ondas muito específicas. “Mas quando a gente está meditando, existe um tipo característico de onda que mostra que a pessoa está em transe. É um transe benigno, melhor que o sono”, explica.

Mas qual é a interferência dessa mudança fisiológica em nosso dia-a-dia? No primeiro semestre de 2012, o Brasil das diferentes religiões se uniu em uma corrente de fé pela recuperação de Pedro, filho do cantor Leonardo. Pedro voltava de um show quando o carro em que ele estava capotou na divisa dos estados de Minas Gerais e Goiás. O cantor ficou internado na capital paulista por 81 dias. Destes, 31 em coma. A recuperação rápida foi atribuída à fé.

O psicobiólogo afirma que todos tentam explicar, mas ninguém chega próximo de uma explicação que seja uma explicação plausível. “Então ainda estamos engatinhando. É um terreno absolutamente espinhoso, arenoso, mas a neurociência começa a nos conceder algumas respostas sobre a peculiaridade da biologia do funcionamento do cérebro durantes estes transes religiosos”, afirma.

G1