Artigo escrito originalmente como contribuição ao Carta Potiguar
Por Pedro Paulo (psicólogo em formação)
Por Pedro Paulo (psicólogo em formação)
Em comemoração aos 150 anos da Caixa Econômica Federal, a instituição bancária lançou uma propaganda que pretendia engrandecer o patrimônio nacional e a memória brasileira a partir da história de Machado de Assis com o banco, porém o ator que interpretava o mestre da Literatura era branco.
Ao se desculpar pela falha, a Caixa cometeu outro erro quando tentou se justificar dizendo: “O banco pede desculpas a toda a população e, em especial, aos movimentos ligados às causas raciais, por não ter caracterizado o escritor, que era afro-brasileiro, com a sua origem racial.”.
A linguagem pode passar despercebida para muito de nós, porém ela se constitui como um reflexo das mais poderosas formas de representações sociais e nas principais formas da expressão de poder do nosso mundo. Neste sentido, discuto aqui não apenas o preconceito, mas um problema silencioso: a linguagem como forma de opressão.
Poderia haver algum mal no uso do termo “Afro-brasileiro”? Aparentemente não, mas então por que não fazemos também uso de termos como: “Euro-brasileiro” ou “Euro-descendente”? No Brasil pessoas brancas são chamadas de brasileiras, porém estas não se percebem como euro-brasileiros, enquanto que negros são chamados de Afro-brasileiros como se fossem de outro país.
Mas o que quer essa linguagem? A genealogia do termo afro-brasileiro tem seu antecessor na palavra “negro” que na sua origem etimológica descreve sujeitos com um fenótipo de pele escura que no Brasil ficou associado historicamente à escravidão. Após o fim da escravidão, a palavra negro é substituída gradualmente pelo vocábulo “afro-brasileiro” que se dissocia do estigma da servidão, porém passou a representar pessoas que moram em uma nação mas não a constituem como povo, em outras palavras, quando o negro não pode ser escravo deve se torna estrangeiro(afro-brasileiro).
É certo e até mesmo evidente que a corrupção da linguagem é essencial para a manutenção de uma ideologia dominante que deseja manter o estado de diferenciação entre os sujeitos, mas o objetivo dessa linguagem segregacionista não se faz apenas no âmbito da ética ou do campo linguístico, se faz também no processo de concepção do próprio ser, no processo de subjetivação e na identidade, no qual o sujeito se constitue apenas enquanto vocábulo e não em uma relação social dialética no qual é o próprio autor de sua história.
Dado o exposto, podemos considerar que historicamente o sujeito negro ou afro-brasileiro é uma invenção do nosso modo de falar que constitui o sujeito enquanto indivíduo passivo, sem participação na formação de sua própria identidade e sendo assim um alvo fácil de manipulação.